É na faculdade que uma pessoa mais aprende a viver do que
uma profissão propriamente dita. Muitas vezes é durante o tempo de curso,
morando sozinha, que a pessoa enfrenta suas primeiras adversidades. Sente na
pele o que é acabar o dinheiro no dia 15 do mês, anda a pé, aprende que Miojo é
seu melhor amigo e que a louça suja é seu pior inimigo, entre outras situações
que provavelmente ela passará na vida após a faculdade. Pode ser lá também que
ela encara o mundo e vê que as pessoas não são iguais, que não amam iguais, não
rezam pros mesmos seres divinos, que tem mais ou menos melanina na pele e que somente
o suado dinheiro dos pais não é suficiente pra bancar os estudos.
Até então não há curso ou algo parecido que prepare essa
pessoa para o verdadeiro aprendizado da faculdade. Se não foi educada ao longo
da vida pelos pais que o mundo é assim, com fulanos e cicranos, a faculdade
será um grande calvário, já que as cotas sociais e raciais estão aí, queira ou
não.
E se o intuito máximo da faculdade não é o aprendizado
acadêmico, cai por terra o assombroso e arcaico vestibular. Decorar que o ácido
sulfúrico é H2SO4 e saber diferença entre mitose e meiose apenas por saber já
não faz tanto sentido, já que, a não ser que o indivíduo seja um químico,
biólogo ou algo do gênero, você nunca vai usar isso na prática.
Eis que surge o maior sistema de ingresso ao ensino superior
do ocidente: O ENEM 2015. Com questões envolvendo textos sobre a luta feminista,
letra de canção afrodescendente, charge
de Ziraldo entre outros tópicos que serão
discutidos até as Olimpíadas. Mas qual o problema em ser discutido? Se o mundo
fosse um arco-íris com o Brasil no fim dele com o pote de ouro, discutir seria inútil,
mas há problemas envolvendo a intolerância e eles devem ser discutidos antes por todos antes dos pobres
pré-universitários entrarem “crus” na vida acadêmica.
Várias fotos de provas rasuradas circulam pelo Facebook e
Twitter. Provas quais o candidato se recusa a responder questão com letra do
Pixinguinha, pois, segundo ele, é “macumba”, ou outra que a ignorância não
deixa o candidato ler o texto de Simone de Beauvoir além de “ninguém nasce
mulher”. O tema da redação é cirúrgico, atual e tem valor altamente social. Embora a redação avalie apenas o domínio da
língua e do assunto em questão, a qual deixa de lado a questão filosófico/social,
a discussão gerada em torno do tema da violência contra a mulher é novamente
levantada e é isso o grande papel que o ensino deve exercer.
O ENEM 2015 foi, como nunca, um modo de mostrar que a adversidade
de gêneros, credos e cores é uma realidade. Quem não está pronto a tolerar isso,
quem é contra a discussão do direito da mulher e quem enxerga o mundo como um
senhor feudal não está pronto a ingressar numa faculdade onde quem paga são os
trilhões de reais arrecadados em impostos por todos os negros, mulheres, umbandistas...